Se
você ama uma canção, ama-a o bastante para que ela o acompanhe por diferentes
fases de sua vida e daí qualquer lembrança específica se apaga com o uso.
Mas
às vezes, muito ocasionalmente, canções, livros filmes e fotografias expressam
perfeitamente quem você é. E não fazem isso necessariamente por palavras ou
imagens; a associação é muito menos direta e muito mais complicada que isso.
Dave
Eggers tem uma teoria de que ouvimos certas canções repetidamente, aqueles de
nós que o fazem, porque temos que “liquidá-las”, e é verdade que, no princípio
do nosso namoro com uma nova canção, existe uma fase semelhante a uma espécie
de perplexidade emocional.
Para
mim, aprender a amar canções mais calmas – canções de country, soul e flok,
baladas cantadas por mulheres e cantadas ao piano, viola ou uma porra dessas
canções harmoniosas com nomes como “Carey” (porque qual a pessoa com um par de
ouvidos que não adora Blue? – não tem a ver com ficar mais velho e sim com o
fato de adquirir confiança musical, capacidade de julgar por mim mesmo.
Só
posso dizer que consigo ouvir coisas que não estão ali, ver e sentir coisas que
normalmente não consigo ver e sentir e começo a perceber que, sim, existe algo
como uma alma imortal ou, no mínimo, uma consciência humana unificadora, que
nossas vidas são curtas, mas têm um significado.
A
melhor música conecta-se à alma, não ao cérebro e temo que toda essa devoção a
Dylan seja de algum modo antimúsica – que ela nos cause a impressão de que o
coração não conta e só a cabeça importa.
Se
conseguirmos ouvir Dylan e os Beatles em sua forma inequivocamente mais pura no
seu auge – mas uma forma inequivocamente pura de um jeito que não ouvimos mil,
um milhão de vezes antes – nós de repente obteremos um pequeno mas eletrizante
lampejo do espírito deles e isso é o mais próximo que aqueles de nós nascidos
na época errada chegaremos a saber de como deve ter sido ouvir essas músicas
jorrando do rádio quando não se esperava por elas, nem por nada como aquilo.
Em
outras palavras, letras de amor são como um instrumento musical e canções de
amor tornam-se de algum modo pura canção. Talvez seja isso que dê a vantagem a
“You had time”: nossas separações, no fim das contas, têm mais melodia do que
nosso trabalho.
Mas
meus solos favoritos são aqueles que de alguma maneira mostram que o solista
sentiu a canção, as palavras, a música e tudo o mais, sentiu a canção e captou
sua verdadeira natureza, o que torna o solo não só uma reinterpretação
imaginativa dela, mas também expressa e contribui para seu sentido e essência
como um comentário crítico prático e brilhante.
É
importante que ocasionalmente, talvez até com mais frequência, fiquemos
deprimidos por livros, sejamos desafiados por filmes, chocados por pinturas,
até mesmo perturbados pela música. Mas será que eles têm que fazer essas coisas
o tempo todo? Não podemos deixar que nos consolem, elevem, inspirem, emocionem,
alegrem? Por favor. Só de vez em quando, quando temos um dia realmente de
merda?
Só
quando conhece e ama uma banda é que você se torna o tipo de crítico de música
que quaisquer revista e jornal deveriam contratar.
O
acorde, o mais simples componente para até mesmo a mais banal e tola canção de
parada de sucesso, é uma coisa linda, perfeita, misteriosa e, quando um
brutamontes pouco instruído, inculto, rude, emocionalmente ignorante junta
alguns desses acordes, tem toda a possibilidade de criar algo maravilhoso e
poderoso.
[...]
A música serve como forma de auto-expressão mesmo para aqueles de nós que
conseguem se expressar razoavelmente bem pela fala ou pela escrita [...]
Não
posso mais me dar ao luxo de ser um presunçoso do pop e se lá fora existe um
trecho de música que tem a capacidade de me comover, então quero ouvi-lo, não
importa quem tenha feito.
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